Bom, meu nome é Otávio, tenho 31 anos, sou um ex-neonazista e hoje eu sei o quanto eu havia me distanciado do caminho de Deus, e agora, depois de salvo por Ele, vou lhes contar como me tornei um porco nazi-fascista.
Em meados de 2002 eu freqüentava um fórum neonazista na internet só pra tirar onda.
A maioria deles ficava discutindo o resgate do nacional-socialismo, enquanto eu ficava só xingando, falando que preto era bicho, viado tinha que morrer, só pra brincar, sabe?
Só pra constar: Hoje eu sei que isso foi errado e me arrependo por cada tópico que criei ofendendo as minorias. Obrigado.
Neonazistas atraem seguidores com imagens e promessas de sexo com skinhead-girls gostosas. Não caia nessa!
O membro VIP mais fodão desse fórum era a Freya, uma loira de olhos azuis, que se vangloriava por ser descendente de alemães e cujo bisavô lutou na segunda guerra e matou alguns “comunistas desgraçados”, segundo ela
A primeira vez em que a vi foi numa foto que ela postou no fórum, na qual ela, de cabeça raspada, espancava uns mendigos bêbados junto a uma gangue skinhead. Embaixo da foto havia a inscrição: FORÇA À RAÇA ARIANA.
Eu me apaixonei perdidamente por Freya desde então.
Como ela era uma neonazista classe A, eu resolvi parar de zoeira, encerrei a conta no fórum e criei outra com o nick Hanz88.
Percebi que ela só falava com pessoas entendidas dos ideais nazi-fascistas. Então, devido a essa paixão, comecei a me interessar e a me aprofundar na história e na ideologia deles.
Perguntei se ela poderia me passar seu MSN. Ela me disse que passaria se eu atendesse aos seguintes requisitos:
1 – Ser branco
2 – Ser loiro de olhos claros
3 – Ser careca
4 – Odiar negros, judeus, nordestinos e homossexuais.
Eu disse que atendia a todos os requisitos, mesmo eu sendo filho de mulato. Meu pai é natural de Pernambuco e se mudou pra São Paulo em 98. Sou um pouco escurinho também, mas só um pouco. Mas se eu falasse a verdade ela não iria se interessar por mim.
Eu/\
Eu disse que era alto, loiro, olhos verdes, skinhead e que defendia a bandeira nazista até a morte se preciso. Heil!
Ela gostou.
De vez em quando eu saia à noite aqui na minha cidade e espancava uns travecos e tirava foto deles caídos sangrando e mandava pra ela. Minha amada xenofóbica se deliciava com isso.
Mantivemos contato por vários meses. Ela contava como combatia as minorias na cidade dela, Florianópolis, espancando e queimando vivos pretos, nordestinos e os gays. E eu cada vez mais apaixonado e apavorado, temendo a hora em que ela pedisse para nos encontrarmos.
Não demorou muito para isso. Ela me convidou para passar um fim de semana na casa dela e ainda me deu a idéia de que queria dar pra mim.
Eu aceitei na hora, estava louco pra beijar aquela boca suja de tanto gritar palavrões contra minha raça. Queria apertar aquele corpo musculoso de tanto quebrar ossos de meus conterrâneos.
Até hoje, mesmo curado dessa “doença” que é o neonazismo, eu tenho tara por mulheres de coturno…
Economizei uma grana porque a viagem era cara pra cacete, e fui pra lá. Horas e horas de aperto e canseira, cheguei em Floripa, mas não para ir à praia. E sim para ver minha Freya.
Já passava da meia noite, a rodoviária tava quase vazia.
Desci do ônibus e já a vi. De cabeça raspada, coturno e roupas militares, cara de malzona. Delícia. Lembro como se fosse hoje.
Ela gritava:
- Hanz! Hanz! – me procurando.
Eu não me segurei e acenei, dizendo:
- Sou eu.
Ela me olhou com aqueles lindos olhos azuis e berrou:
- EU SABIA QUE VOCÊ ERA PRETO, SEU FILHO DUMA VACA!
Eu congelei. Detrás dela surgiram vários carecas grandalhões com tatuagens de suásticas e.. correntes, paus, pedras e canivetes.
Tomei no cu, pensei. Mas que eu devia esperar? Que o amor falasse mais alto, é claro. Mas não falou.
Me acertaram uma pedrada bem no meio da testa.
- MATEM O URUBU! – um deles gritou.
Eu corria de um lado pro outro da rodoviária tentando me desviar da chuva de pedras e pedaços de pau. Me acertaram uma pedrada no joelho, eu caí. Quando me levantei veio um carecão e me deu uma voadora nas costas que me fez voar longe. Aí foi só festa.
O que houve foi um massacre. Vários minutos eu, caído no chão, encolhido, levanto chute na cabeça, cuspida, mijada na cara, correntada nas costas e soco na orelha sem parar.
Puta que pariu, que cagada que eu fui fazer – era o que eu pensava enquanto eu implorava pela minha vida.
E quando a Freya veio com um canivete pra me furar todinho, uma voz gritou:
- PAREM, SEUS ANIMAIS! EU CHAMEI A POLÍCIA, SEUS DESGRAÇADOS!
Pararam de me bater um pouco para ouvir e havia mesmo um barulho de sirene que, mesmo ainda meio distante, fez os skinheads malditos correrem. Não sem antes mandar três chutes bem fortes nas minhas costelas.
Eu não conseguia me mexer. Meu corpo todo doía. Não conseguia nem respirar direito. Tinha certeza que duas ou três costelas estavam quebradas. Minha cabeça sangrava. Minha mão estava toda pisoteada.
Só ouvi os passos do meu salvador se aproximando de mim, junto com outro homem.
E nunca vou esquecer da primeira coisa que ele disse ao me ver:
- Tinha que ser preto mesmo…
Alguém me levou à Santa Casa e lá eu conheci um pastor evangélico paraibano que também havia sido espancado por skinheads na mesma noite. Ele disse que nosso sofrimento foi um teste de Deus e o nosso encontro ali foi o destino escrito por Ele. O Senhor estava querendo me acolher, queria que eu voltase a seguir o verdadeiro Caminho.
Fui salvo. Hoje sou membro fiel da igreja Assembléia de Deus, tenho orgulho em ser casado com uma mulata e ter três filhos negrinhos.
E aqui diante de vocês, peço perdão a todos os travecos que espanquei e a todos os nordestinos que ofendi naquele fórum virtual.
Agora só critico os católicos. Convertam-se enquanto é tempo, infiéis! Porque a segunda vinda de Jesus Cristo está próxima!
Glória e Paz em Cristo,
Otávio Luiz da Silva.
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